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Já estou cansada de ouvir a frase “tens de começar a comprar livros pra a tua idade!”
É verdade, eu tenho uma paixão por livros infantis.
Se há paixões para as quais nós não conseguimos descortinar razões, neste caso eu consigo enumerar pelo menos três razões para gostar tanto de livros infantis. Em primeiro lugar, eles fazem parte das minhas memórias de infância. Os meus pais liam-me histórias antes de adormecer, eu pedia as mesmas constantemente (como é frequente nas crianças), sabia algumas histórias e poemas de cor e tinha dois ou três livros que a minha memória guardou como tesouros e que ainda hoje habitam numa das mais importantes prateleiras da minha estante.
A segunda razão é porque a minha mãe é professora de Língua Portuguesa e acumulou em casa uma estante inteira de histórias para os mais pequenos. A estante é demasiado grande para se dever única e simplesmente à sua profissão ou ao facto de ter tido três filhos que, por sua vez também iniciaram as suas colecções. Creio porém que ela fica feliz de poder justificá-la dessa maneira às pessoas crescidas embora eu saiba que a principal razão é que muitos destes livros são autênticas obras literárias, autênticas obras de arte. Para mim é uma justificação mais que legítima e que eu partilho inteiramente.
A minha última razão deriva necessariamente das duas anteriores. Durante o doutoramento percebi o quanto os livros infantis podem ser importantes ferramentas de comunicação do tema da biodiversidade já que estão repletos de seres vivos. Motivada por este pensamento, fiz um grande estudo sobre a forma como a biodiversdade está presente nos livros para a infância. É um estudo complicado mas com um princípio e uma conclusão muito simples.
O poder dos livros infantis sobre mim foi, a partir desse momento, arrebatador. Não consigo entrar numa livraria sem passar pela área infantil, já perdi a vergonha de só requisitar livros infantis na biblioteca e dizer que são para mim, de ser a única adulta nos sofás dedicados aos miúdos e já me vi aconselhar com sucesso alguns adultos desorientados à procura de um bom presente. Até já ofereci livros infantis a outros adultos (sim, para além da minha mãe)…
Isto pode parecer não ter nada a ver com o tema do “fazer à mão”, mas faz parte, certamente, do tema “viver devagar” que lhe está imediatamente associado. Senão, ora vejam:
Face aos desenhos animados tão intensos e cheios de efeitos extraordinários, é fácil desvalorizar o poder de um bom livro infantil. Contudo há uma coisa que nenhum desenho animado permite: ter poder sobre o ritmo. Um livro lê-se mais depressa ou mais devagar, à medida do leitor. Podemos dispensar horas num só poema e há quem domine a técnica vulgarmente denominada “ler na diagonal” e captar o que para si é o bastante num tempo recorde. No caso dos livros infantis esta questão ainda se torna mais evidente. A combinação das imagens com o texto faz com que haja vários níveis de profundidade em cada página nos quais o leitor se pode perder e imaginar. E não desvalorizem a mente de uma criança: há palavras que de preferência não são ditas, há imagens que contam à maneira de cada um dando-nos o tempo e o espaço necessário para imaginar. Não há nada melhor para apaziguar, fortalecer perspectivas, aumentar a auto estima do que ler e explorar ao nosso próprio ritmo. E isso aprende-se de pequenino, com um bom livro na mão.
Mais, quando é que perdemos o hábito de ir à biblioteca e lá perder um bom pedaço só a explorar as prateleiras ainda que seja lado a lado com um miúdo de 8 anos? Porque razão acham que nas bibliotecas infantis há um tapete no chão com almofadas? É obviamente para todas as alturas se poderem sentar (ou deitar) e demorar! Quando é que viver devagar e explorar saiu de moda?
Não consigo pensar que este será o único post em que falo de livros infantis pelo que entretanto prometo actualizar e recomendar as minhas novas aquisições. Por hoje queria falar-vos de sete livros com mensagens poderosas para pequenos e grandes.
I’m tired of hearing: “you have to start buying books for your age!”
It’s true, I have a passion for children’s books.
If there are passions for which we can not understand the reasons, in this case I can enumerate at least three reasons to love children’s books so much. First of all, they are part of my childhood memories. My parents read me stories before sleep, I asked for the same stories constantly (as children do often), I knew some stories and poems by heart, and I had two or three books that my memory kept as treasures and that still inhabit on one of my most important shelves.
The second reason is because my mom is a Portuguese Language teacher and she has accumulated an entire bookshelf of stories for the little ones. The bookshelf is too large to be solely due to her profession or to the fact that she had three children who also started their collections. I believe, however, that she is happy justify it in this way to the grownups, although I know the main reason is that many of these books are authentic literary works of art. For me this is a more than legitimate justification and that I fully subscribe.
My last reason necessarily derives from the previous two. During my PhD I realized how children’s books can be important tools for communicating the theme of biodiversity since they are full of living beings. Motivated by this thought, I did a large study on how biodiversity is present in books for children. It is a complicated study but with a very simple principle and conclusions.
The power of children’s books over me was, from that moment on, trully overwhelming. I can’t enter a bookstore without visiting the children’s area, I’m not embarrassed any more by borrowing children’s books in the library and say that they are for me or to be the only adult in the kid’s sofas at the bookstores. I already successfully advised some disoriented adults looking for a good gift and I even offered children’s books to other adults (yes, besides my mom)…
This may seem to have nothing to do with the “handmade” theme, but it is certainly part of the “slow living” theme that is immediately associated with it.
Compared with cartoons that are so intense and full of extraordinary effects, it is easy to devalue the power of a good children’s book. However there is one thing that no cartoon allows: to have power over the rhythm. A book can be read as fast or slow as we want. We can spend hours in a single poem and there are those people who master the technique of capturing a book content in a record time. In the case of children’s books this is even more obvious. Combining the images with the text means that there are several levels of depth on each page for the reader to spend time, get lost and imagine. And please, do not undervalue a child’s mind: there are words that don’t have to be written, there are images that tell the way by themselves, giving us the necessary time and space to imagine. There is nothing better to appease, strengthen perspectives, increase self-esteem than read and explore at our own pace. And this is learned as early as you can imagine since you have a good book in your hand.
Plus, when did we lost the habit of going to the library and spend a good time just exploring the shelves, even if it’s side by side with an 8-year-old kid? Why do you think that in children’s libraries there is a rug on the floor with cushions? It is obviously for all heights to sit (or lie down) and delay! When did slow living and exploring went out of style?
I can not think that this will be the only post in which I speak of children’s books so I promise to update and recommend my new purchases sometimes. Today I wanted to tell you about seven books with powerful messages for young and old “children”.
O primeiro foi-me oferecido pela respectiva editora aquando do estudo que referi acima. Chama-se “Espelho”, escrito pela autora Susy Lee e é um album, ou seja, um livro no qual a imagem prepondera sobre o texto. Neste caso não há de todo texto mas suas poderosas ilustrações criam uma história de descoberta. Tenho-lhe especial carinho porque me revejo um pouco e, mais tarde, ofereci-o a um amigo que me dizia que por vezes é preciso fazermos umas boas caretas ao espelho para entrar nele e conhecermo-nos no íntimo da nossa sensibilidade e criatividade.
The first one was offered to me by the publisher during the study I mentioned above. It is called “Mirror“, written by Susy Lee and is a silent picture book, a book in which the image predominates over the text.In this case there is not text at all but its powerful illustrations create a story of discovery. I have a special affection for this one because I see myself on that story and later I offered it to a friend who once told me that sometimes we must make faces at the mirror to enter it and to know ourselves deeply, our sensitivity and creativity.
Outro livro inesquecível para mim chama-se “Selma” autora Jutta Bauer. É um livro bem pequeno mas tem dentro de si uma das maiores lições sobre o que é a felicidade, o significado do sucesso e da importância de uma vida preenchida… do que amamos fazer, seja isso o que for aos olhos dos outros.
Another memorable book for me is “Selma” by Jutta Bauer. It is the smallest book but it has one of the greatest lessons about what happiness is, the meaning of success and the importance of a fulfilled life … with what we love to do, whatever that is and whatever it may seems to others.
Tenho porém uma relação agridoce com um livro, mais uma vez um album, chamado “Aquário” de Cynthia Alonso. E foi porque me deixou esta sensação tão marcante que o trouxe para a minha prateleira. Por vezes temos de resolver-nos e desafiar-nos. Confesso que, até hoje ainda não fiz as pazes com ele: deixa-me algo triste mas reconheço-lhe o encanto. O livro conta sobre uma amizade entre uma menina e um peixe. Apesar de se divertirem muito pertencem a mundos bem diferentes…
I have, however, a bittersweet relationship with a book called “Aquário” by Cynthia Alonso, and it was because it left me this striking feeling that I brought it to my shelf. We sometimes have to solve ourselves and challenge ourselves. I confess that I still haven’t made up with him: it makes me a little sad but I recognize its magic.This book tells about a friendship between a girl and a fish.Though they have a lot of fun together, they belong to very different worlds…
Como bióloga, não pude de me deixar impressionar pelo poder do livro “A Toupeira que Queria Saber quem lhe Fizera Aquilo na Cabeça” de Werner Holzwarth. O livro conta a história de uma toupeira que aborda uma série de animais, determinada em descobrir quem foi o palerma que lhe fizera “aquilo” em cima da cabeça! Não sei se a história foi pensada com esse objectivo mas, consciente ou inconscientemente, mostra como através das características dos vestígios deixados pelos animais os biólogos conseguem estudar a presença e distribuição de espécies mesmo quando é difícil observá-los.
As a biologist, I could not help myself to not be impressed by the power of the book “The Story of the Little Mole Who Knew it Was None of His Business” by Werner Holzwarth. The book tells the story of a mole approaching several animals determined to find out who was the fool who did “that” over her head. I don’t not know if the story was intended for this purpose but, consciously or unconsciously, it shows how biologists can study the presence and distribution of species through the traits left by animals when it is very difficult to observe them.
“Este Alce é Meu” de Oliver Jeffers é um livro que nos devolve à nossa pequenez. Temos uma tendência para achar que somos donos de tudo. Mais, que somos donos de alguém e que podemos mudar-lhes ou afinar-lhes os hábitos, os gostos, as relações… Há um certo egocentrismo, um poder ilusório, como uma fantasia de carnaval, que não é mais que isso, um disfarce, e que nos magoa mais cedo ou mais tarde. Felizmente, o livre arbítrio e a individualidade genuína é inevitável e, para quem tiver essa abertura, é das coisas mais belas que há. O ideal é que, em vez de possuir, nos deixemos cativar.
“This Moose Belongs to Me” by Oliver Jeffers is a book that bring us to our place. We have a tendency to think we own everything, more, that we own someone and that we can change or adjust their habits, they tastes, their relationships… There is a some kind of egocentrism, an illusory power, like a carnival fantasy, which is nothing more than this, a disguise, and that hurts us sooner or later. Fortunately, free will and genuine individuality is inevitable, and for those who have this openness it is one of the most beautiful things there is. Ideally, instead of possessing, let us be captivated.
Foi recentemente que conheci “Uma Aventura debaixo da Terra” de Mac Barnett. É sobre uma dupla de amigos que quase, quase a encontrar um tesouro aventura-se noutra direcção. É um pouco sobre o acaso, o destino mas também de como a mente leve e desprendida nos permite viver verdadeiras aventuras e encontrar os melhores tesouros.
It was recently that I met Mac Barnett’s “Sam and Dave Dig a Hole”. It’s about a pair of friends that almost, almost found a treasure but, every time they were approaching it, they venture in another direction. It is a little about chance and fate but also how a light and detached mind allows us to live true adventures and find the best treasures.
Por fim queria falar-vos de “Vazio” de Catarina Sobral. Mais uma vez é um album e sem vergonha digo-vos que me trouxe as lágrimas aos olhos. Quantas vezes sentimos que somos diferentes e que não há lugar para nós? Sentimos-nos vazios. Tudo nos preenche mas apenas temporariamente… Só quando encontramos uma alma igual, seja ela no amor ou nas amizades, é que ficamos cheios!
E sim, podia prolongar-me indefinidamente. Acho que amanhã vou à biblioteca, alguém alinha?
The last but not the least, I wanted to share “Vazio” by Catarina Sobral, a portuguese author. Once again it’s a silent picture book (so you don’t have to worry about the Portuguese language!) and I tell you that it brought tears to my eyes. How often do we feel that we are different and that there is no place for us? We feel empty. Everything that fills us seems only temporary… It’s when we find an equal soul, in love or in friendship, that we feel full!
And yes, I could go on indefinitely. I think I’m going to the library tomorrow, who’s in?
2 Comments
Adorei! Também sou devoradora de livros e fã dos de criança, se bem que me deixo levar pelos mais antigos, com as suas gravuras “vintage”. Por isso, este post foi ainda mais inspirador, no sentido em que deixa sugestões para outro tipo de livros que me parecem igualmente “saborosos”.
Eu também tenho um grande apreço pelos vintage e ainda colecciono alguns das minhas memórias. Mas confesso que a minha paixão é ainda maior por esta nova onda! A verdade é que mesmo assim é preciso perder algum tempo para encontrar bons livros… Mas são tão bonitos!