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Este é o segundo post na serie “A few of my favorite things”. Para quem lê, é possível imaginar que há uma ordem de preferências nestes posts. Claramente não há, nenhuma. Talvez haja, isso sim, momentos para o post certo. E hoje é o dia certo para este.
Uma das minhas coisas favoritas é cantar. Cantei toda a minha vida. Tenho duas cassetes cheias de gravações das minhas cantorias aos 3, 4 anos de idade. Depois cantei anos a fio num pequeno coro de crianças. Mais tarde, no fim da minha adolescência, fui convidada por uma amiga para uma audição. E sem dar por mim, comecei a cantar de forma mais séria num grande coro que responsabilizo totalmente por me ter oferecido um mundo novo. Desde esse momento, já se passaram mais de 12 anos, alguns outros coros pelo meio, e hoje posso dizer que cantar é do melhor dos meus dias.
Eu sou uma introvertida: se falar é difícil, quanto mais cantar? Os introvertidos são famosos por terem dificuldades em expressar-se por palavras, em trabalhar em grandes grupos e assumir lideranças… o que, desenganem-se, não significa que não consigam fazer, e sem igual ou comparação, todas essas coisas. Talvez precisem de estratégia! Uma delas, garanto-vos, é ter momentos contínuos de desafio… mas com risco pequeno. Como para toda a gente, esses momentos são importantes para criar equilíbrio, autoconfiança, determinação e uma sensação de expansão interior. Dar espaço para esses momentos é fundamental para nos prepararmos para os grandes riscos que a vida nos propõe. Porque um introvertido vai preparar-se sempre para fazer bem, nunca para menos.
Ora eu tenho a sorte de cantar. De cantar num coro onde nunca senti o peso das minhas limitações, onde o pouco que dou é ouro, sempre ouro. E onde por causa disso eu me desafio ensaio após ensaio, sem abrir excepções. Onde gravaram em mim o sentimento de ser, como todos, absolutamente essencial. Onde aprendi mais do que imaginei conquistar, onde cresci muito para lá do tamanho da minha altura, onde me conheci e constantemente me superei e surpreendi! Onde sem dar conta, me fui deixando partilhar como coralista e como pessoa. Onde me assaltaram, desprevenida, com amizades para a vida. Onde o lema é nunca ferir os sonhos e sentir, deliberadamente e sem constrangimentos, as fantasias que a música cria cá dentro. Eu fico “na zona” e o tempo distorce-se bem ao jeito da teoria da relatividade, essa que os corações sempre souberam existir aguardando simples e pacientemente que um espírito aberto a descobrisse e a formulasse com números e letras.
Cantar em coro é para mim uma forma gratificante de criar algo com e para o resto do mundo… Mas cantar entre amigos, ah, como é intenso! Transmite uma lealdade e confiança que o dia-a-dia não assegura. Que nenhuma conversa, nenhum abraço substitui. Cultiva arrepios conjuntos, calores concertados, silêncios a oito vozes, segredos suspensos e sorrisos cúmplices. E cria aquele lugar elementar onde os sentimentos se expressam sem sobrecarregar as palavras, dando-lhes o descanso necessário para as usarmos como ferramentas nos desafios de todos os dias. Afrouxa-nos os nós, restaura uma nostalgia saudável, pulsa emoções esquecidas. Despe-nos, deixa-nos complacentes, tolerantes. E por ironia das nossas vidas tão preenchidas mas tão pouco vividas, para isto, basta um punhado de gente munida das duas cordas vocais com que a natureza nos presenteou. A palavra que, com isto, estou a tentar definir é “arrebatador”.
This is the second post of the serie “A few of my favourite things”. You may imagine that there might be some kind of preference in the order of the posts. Clearly there isn’t. Maybe, however, there are proper moments for the right post. And today is the day for this one.
One of my favourite things is singing. I sang all my life! I have two cassettes full of homemade recordings of my songs when I was 3 or 4 years old. After that, I sang for years in a small children choir. Later, at the end of my adolescence, I was invited by a friend to an audition. And without knowing exactly how, I began to sing more seriously in a big choir that I totally blame for offering me a completely new world. Since that time, more than 12 years have passed, I joined some other choirs in between, and today I can say that singing is the best of my days.
I’m an introvert: if talking could be difficult, what about singing? Introverts are known for having difficulties expressing themselves in words, working in large groups and taking leadership… which, don’t fool yourself, does not mean that they can’t do all those tasks extremely well. Maybe they just need strategy! One strategy, I assure you, is to have continuous (but small) moments of challenge. As for everyone, these moments are important to create balance, self-confidence, determination and a sense of inner expansion. Making room for these moments is fundamental to prepare ourselves for the great risks that life presents us everyday. Because an introvert will always, always prepare himself to do something “very well”, never less.
Well, I’m lucky enough to sing! I’m lucky to sing in a choir where I never felt the weight of my limitations, where the small things I give are simply gold, always gold. And where, because of this, I challenge myself rehearsal after rehearsal without making exceptions. Where people impressed on me the feeling of being, as every other member, absolutely essential. Where I learned more than I imagined conquering, where I grew much beyond the size of my height, where I met myself and constantly overcame and surprised myself! Where I opened myself as singer and as a person without making it hard for me. Where I was assaulted, totally unprepared, with friendships for life. Where the motto is never hurt your dreams and feel, deliberately and without constraints, the fantasies that the music creates inside. I get “in the zone” and the time distorts just as relativity determined, that strange theory that the Human heart always knew to exist, but just waited patiently for an open spirit to discover it and formulate it with numbers and letters.
For me, singing is a rewarding way to create something with and for the rest of the world… But singing among friends, ah, how intense it is! It conveys a loyalty and confidence that daily life does not guarantee. That no conversation, no embrace replaces. It cultivates joint shivers, concerted heats, eight voices silences, suspended secrets and complicit smiles. And create that elementary place where the feelings express themselves without overloading words, giving them the deserved rest for us to use them as tools in the every day challenges. It looses the knots, restores a healthy nostalgia, pulsates that forgotten emotions. It leave us naked, complacent, tolerant. And as an irony in our lives so full but so little lived, for this, we just need a handful of people equipped with the two vocal cords that nature kindly offered us. The word I am trying to define with this is “overwhelming”.