Dream pills

 

(scroll for the English version)

 

Há uns tempos a Constança partilhou um vídeo sobre uma venda de garagem onde encontrou um exemplar do Ben Hur do início do século XX. Chamem-nos sonhadoras, nostálgicas, mas as coisas antigas acumulam histórias que são o alimento da memória. Os objectos herdam muito mais do que a sua mera existência.

 

Atrevo-me a dizer que um dos meus objectos favoritos é este velho livro.
Um dos meus colegas encontrou-o quando, a caminho do trabalho, viu um senhor deitar fora uma autêntica biblioteca. Ficou chocado e pediu-lhe que não continuasse mas o dono dos livros reclamava a sua arbitrariedade. Quem é que faz uma coisa destas? Quem é que deita livros ao lixo?
Eu nunca lhe perguntei mas acredito que o meu colega se tenha sentido algo impotente naquele momento e, na expectativa de salvar alguma coisa, pediu ao senhor que o deixasse trazer alguns livros com ele.
Deixou uns quantos em cima da minha secretária para eu escolher.
Eu escolhi este “Works of Shakespeare”. Bom, confesso que julguei o livro pela capa. Não estou orgulhosa disso mas deixo aqui as minhas razões:
Um livro chamado “Works of Shakespeare” só pode ser bom, certo? Todos conhecemos as suas histórias, as suas personagens e a sua linguagem tão característica. Não me interpretem mal. Não estou a dizer que não vale a pela lê-lo e que basta tê-lo na prateleira. Eu li algumas peças e, como previsto, adorei. É Shakespeare e eu sou uma romântica, não estava à espera de outra coisa.
Por outro lado, eu apostava um bom desfecho para aquela capa: a sua textura e cor descontinuadas pelo tempo e pelo uso prometiam algo mais excitante do que a originalidade do seu conteúdo.
Mas fiquei ainda mais feliz quando abri o livro e vi esta inscrição na contra guarda:
“From your beloved Ginger. Xmas 1912”.
Ah! Aquilo contava uma história nova que fez a minha mente voar durante umas duas horas. Duas curtíssimas horas, temo. Eu sou uma sonhadora crónica. Aquela inscrição foi a minha droga.

 

 

Some time ago Constança shared a vídeo about an estate sale where she found an old Ben Hur book, from the beginning of the 20th century. One can call us dreamers or nostalgic, but the truth is that old things collect stories that feed memories. Objects can inherit much more that their mere existence.

 

I dare say that one of my favorite objects is this old book.
One of my colleagues found it on his way to work when an old man was throwing books away. He was shooked and asked the old man to stop… vainly. Who throws books away?
I never asked him but I believe my colleague felt powerless, so he asked if he could take some books with him.
He left two or three over my desk for me to pick.
I picked this “Works of Shakespeare”. I confess, I judged the book by its cover! I am not proud of that but these are my reasons:
A book named “Works of Shakespeare” can only be good, right? All of us know his stories, his characters, his language. Everyone knows that this is all good. Don’t get me wrong. I am not saying that it isn’t worth reading. I read some plays and I loved it! Come on, it is Shakespeare, and I am a romantic! It did not surprised me.
On the other hand, I expected a good deal from that cover: its discontinuous texture and colour after so many years and hands, promised even more excitement than the novelty of its content.
I was thrilled when I opened it and saw this inscription at the top of the free endpaper:
“From your beloved Ginger. Xmas 1912”.
Well, that felt like a story. It made my mind fly for two hours. The shortest, I believe. I suffer from an dreaming problem too. That inscription was my drug.

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